Próxima Mesa Diretora só será empossada em janeiro, mas sua eleição havia ocorrido no dia 14 de abril, com mais de oito meses de antecedência. Nessa quinta-feira (7), vereadores aprovaram o restabelecimento das regras anteriores.
A Câmara de Guarapari voltou atrás e anulou, nessa quinta-feira (7), a eleição da Mesa Diretora que comandará os trabalhos administrativos e legislativos da Casa no biênio 2023-2024. Como mostramos em primeira mão aqui, a próxima Mesa só será empossada em janeiro do ano que vem, mas sua eleição havia ocorrido no dia 14 de abril, com mais de oito meses de antecedência, em uma sessão convocada às pressas pelo atual presidente, Wendel Lima (PTB). Nessa eleição antecipada, Lima havia sido reeleito para presidir a Câmara em 2023 e 2024.
No entanto, sob pressão da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Espírito Santo (OAB-ES), os 12 vereadores que integravam a chapa única eleita em abril (incluindo Wendel Lima) apresentaram um projeto de resolução que revoga os efeitos da eleição interna antecipada. Ou seja, os próprios parlamentares diretamente beneficiados pela antecipação desse processo decidiram “melar” a eleição.
Sumariamente votado e aprovado por unanimidade em plenário na sessão ordinária desta quinta-feira – a última antes do recesso parlamentar –, o projeto “torna sem efeito, a pedido, as eleições para Mesa Diretora e comissões permanentes para o biênio 2023/2024, realizadas na 13ª sessão ordinária do dia 14 de abril de 2022”.
Na mesma sessão, os vereadores aprovaram, igualmente em votação relâmpago, outra matéria de suma importância relacionada ao mesmo tema, reeditando as regras anteriores relativas à eleição da Mesa.
Entenda as mudanças
A eleição agora anulada, realizada em 14 de abril, só pôde ser realizada naquela data, daquela forma e com tamanha antecedência, porque os mesmos vereadores haviam criado as condições para isso, poucos dias antes, por meio de uma emenda à Lei Orgânica Municipal de Guarapari aprovada por eles no dia 5 de abril e promulgada no dia seguinte pelo presidente Wendel Lima.
Como mostramos aqui no dia 14 de abril, essa emenda alterou profundamente as regras para a eleição da Mesa Diretora que deve conduzir a Câmara no 2º biênio do mandato (no caso concreto, 2023-2024), introduzindo duas inovações jurídicas: a partir daí, o presidente passou a ter o poder de convocar a eleição a qualquer momento do 2º ano do mandato (no caso concreto, o atual); como se fosse pouco, ainda ficou autorizado a convocar a sessão eleitoral com apenas 24 horas de antecedência, isto é, de um dia para o outro.
Na prática, com a aprovação daquela emenda, o presidente passou a concentrar um poder exorbitante para definir sozinho as regras do jogo, conforme a sua conveniência política. Se assim quisesse, ele poderia marcar a eleição para o dia seguinte, ou para a última sessão de dezembro, enfim, para quando bem entendesse, precisando avisar aos demais somente na véspera da votação. E foi exatamente assim que as coisas ocorreram.
No dia 13 de abril, Wendel Lima publicou o edital de convocação para a eleição da Mesa marcada por ele para o dia seguinte. A chapa encabeçada por ele foi a única inscrita e foi eleita tranquilamente.
Tudo como dantes
De volta ao presente, na sessão desta quinta-feira (7), além de cancelar a eleição realizada em 14 de abril, os vereadores aprovaram uma nova emenda à Lei Orgânica Municipal, reeditando as regras anteriores relativas à eleição da Mesa.
Agora volta a valer o texto antigo, vigente desde 2010 (o mesmo que tinha sido mudado pela emenda de 6 de abril): a eleição deve ser realizada a partir do dia 1º de julho do 2º ano da legislatura e deve ser convocada pelo presidente com pelo menos cinco dias de antecedência – o que, por óbvio, dá mais tempo para eventuais concorrentes se organizarem.
“Menos ruim”, mas longe de bom
Diga-se de passagem, essas regras que agora voltam a valer ainda estão muito distantes do ideal. O texto que durou de 6 de abril a 7 de julho conseguia ser ainda pior, pois concedia poderes ainda mais elásticos ao presidente da ocasião. Mas o que volta a valer também é ruim, pois o presidente imbuído de excessivo poder individual para controlar o processo de escolha dos membros da próxima Mesa.
Na prática, ele continua podendo marcar a eleição para qualquer data, desde que inserida no 2º semestre. Como o 2º semestre já começou, voltar atrás nesse caso não faz lá tanta diferença: ele pode convocar a eleição a qualquer tempo, contanto que publique o edital cinco dias antes.
Sob essas regras, o processo de eleição interna não é nem o mais correto nem o mais democrático, pois carece de previsibilidade e de igualdade de condições de disputa.
Outros maus exemplos
Diga-se de passagem, “jeitinhos legais” como esse não são exclusividade da Câmara de Guarapari. A de Vila Velha fez algo parecido, elegendo em 1º de junho a Mesa que só vai assumir em 1º de janeiro que vem. Não está certo.
A de Vitória está prestes a eleger, na 1ª quinzena de agosto, a Mesa que só vai assumir em 1º de janeiro. Não está certo.
Regras norteadoras
O mais justo e aconselhável neste caso é, em vez de inventar, “fazer o básico” – ou “jogar simples”, como se diz no futebol. Basta reproduzir em nível local as regras das eleições da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, que deveriam servir como balizas: para eleger a Mesa que comandará a Casa no 2º biênio da legislatura, votação na primeira sessão do 2º biênio da legislatura. Simples assim.
É só seguir o exemplo (neste caso, positivo) vindo do Congresso Nacional. E pronto, fim de papo.
Sem jeitinhos, invencionices nem extravagâncias jurídicas.
Explicação política
Como na prática o recuo da Câmara de Guarapari não altera tanto assim as coisas, é possível que os vereadores tenham decidido fazer esse “recuo estratégico” como uma medida preventiva, antecipando-se a uma ação judicial que a OAB-ES poderia mover, questionando a constitucionalidade daquela emenda de 6 de abril que permitiu que a eleição fosse realizada daquele modo.
Agindo preventivamente e cancelando a eleição por vontade própria, os edis se livram do risco e do ônus político de eventualmente, daqui a alguns meses, verem a eleição anulada de qualquer maneira, mas por força de decisão judicial. E agora ficam livres para realizar a eleição novamente, em qualquer data do 2º semestre.
Palavras do presidente
Pré-candidato a deputado estadual pelo PTB, o presidente da Câmara de Guarapari, Wendel Lima – principal beneficiário da antecipação e principal mentor do recuo –, explicitou as suas razões. Segundo ele, “a qualquer momento”, a OAB-ES ingressaria na Justiça com uma ação de inconstitucionalidade da emenda de 6 de abril:
“Quero dizer que nós tivemos dois questionamentos e nenhum deles me fez tomar essa decisão que nós acabamos de tomar em coletividade. Uma foi uma denúncia do Ministério Público, que quem fez essa denúncia perdeu. O Ministério Público arquivou essa denúncia. Deu improcedente a denúncia feita pelo presidente do PDT, porque o entendimento é que é a uma matéria interna corporis. Depois, a Ordem dos Advogados, em um movimento de um determinado advogado da cidade, não sei levantando a bandeira de qual lado político, foi e fez um movimento na Ordem. E fui numa reunião na Ordem e lá foi salientado que, a qualquer momento, entraria também esse pedido de inconstitucionalidade.”
Ele explicou, ainda, por que preferiu não litigar na Justiça:
“Podia brigar por essa constitucionalidade? Podia, sim. Até porque eu gosto de desafios. Mas eu acho que a democracia vale no voto. Então, se eu tiver a adesão da maioria dos colegas, numa próxima oportunidade, se lá eu estiver com meu nome à disposição, eu vou lutar para conseguir êxito no processo. E assim eu sempre fiz. Nunca me acovardei a nada. Sempre coloquei minha cara na reta.”.
(DA REDAÇÃO \\ Gutemberg Souza)
(INF.\FONTE: ES360 \\ Vitor Vogas)
(FT.\CRÉD.: AssCom CMGp \\ Divulgação)